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COLUNISTAS

Men at Work em Curitiba

13/03/2024 - 18:13h
Atualizado em 13/03/2024 - 19:28h


 

O movimento musical conhecido como New Wave potencializou aspectos visuais e sonoros que deixaram marcas definitivas no início da década de 1980. Ao mesmo tempo, transformações tecnológicas ocorriam no âmbito da iluminação cênica, que impactaram na constituição e no estabelecimento de estéticas associadas a bandas e artistas que se perpetuam de maneira nostálgica e são retomadas nos espetáculos da atualidade. Nesta conversa, alguns desses elementos serão contextualizados com o show da banda australiana Men At Work, realizado em Curitiba em fevereiro deste ano.

 

Aproveitando um questionamento da conversa anterior (centrada no show da banda inglesa The Cure), as tentativas de descrição da década de 1980, mesmo com um recorte artístico e específico na música pop, podem ser tarefas complexas. Isto  pelas diversificadas variáveis e abordagens cabíveis. Com liberdade poética, uma abordagem poderia ser descrita a partir de “texturas musicais” que aproximam estilos, bandas, artistas e estéticas. Naturalmente, o contexto de textura não se aplica exclusivamente à materialidade; trata-se de um conjunto de sensações e experiências que proporcionam, para quem vivenciou aquele período, inúmeras lembranças, significativa nostalgia.

 

No campo da visualidade, foi o decênio marcado pela explosão dos videoclipes – já existentes nas décadas anteriores, mas consolidados com o surgimento de programas e canais dedicados parcial ou totalmente a essas produções -, registros fundamentais para o estabelecimento das imagens, referências, conexões e aproximações dos fãs com novas percepções de moda, design, comportamento, identidade cultural, grupos sociais, e, com ressalvas, novas ideologias. Também, pelas transformações tecnológicas no âmbito da iluminação cênica que culminaram nos Moving Heads, significativos paradigmas no desenvolvimento de projetos dos shows, desde então.

 

Essas combinações entre as sonoridades e as linguagens visuais daquela época estabeleceram associações, referências e influências que se mantém até a atualidade. São inúmeros os exemplos; especificamente nessa conversa, será apenas destacada a banda australiana Men At Work, que neste ano fez sua quarta turnê no Brasil e a segunda vinda para a capital paranaense (anteriormente, havia se apresentado em Curitiba no “lendário” bar Coração Melão, em 1996).

 

 


Aspecto da “South American Tour” da banda australiana Men At Work (Live Curitiba - (20/02/2024). Fonte: Cezar Galhart

 

 

Formada em Melbourne (Austrália) em 1979, no contexto da New Wave, movimento musical caracterizado por sonoridades influenciadas pelo Pós-Punk e Reggae, ao mesmo tempo em que lançaram o primeiro álbum, produziram diversos videoclipes, marcados por narrativas que mesclavam reflexões sobre o existencialismo, fracassos e muito humor. Rapidamente, conquistaram sucesso internacional, projetando a banda nos principais rankings de sucessos e exposição visual, resultando em certificações de vendas e premiações. Tão meteórico quanto esse êxito foi a dissolução da banda, em 1985, após o terceiro álbum de estúdio.

 

Da formação original, e desde então, Colin James Hay, compositor, multi-instrumentista, cantor e ator, reformulou a banda diversas vezes, com o nome original, inclusive com o retorno de Greg Ham (falecido em 2012) em diversas oportunidades, sendo duas dessas no Brasil, com a primeira registrada ao vivo no álbum “Brazil”, de 1996.

 

Hay também desenvolveu uma bem-sucedida carreira solo, com quinze álbuns lançados e turnês mundiais, contemplando passagens também pelo Brasil em quatro oportunidades, com destaque para a segunda edição do Rock In Rio, em 1991, sendo duas apresentações em Curitiba, em 2007e 2011. Destaca-se também as três oportunidades em que Hay integrou a All-Star Band, projeto do magistral baterista e Beatle Ringo Starr com músicos de diversas e renomadas bandas.

 


Aspecto da “South American Tour” da banda australiana Men At Work (Live Curitiba - (20/02/2024). Fonte: Thales Beraldo

 

 

Neste ano, Hay voltou ao Brasil para uma turnê regional, intitulada “South American Tour” (que, além do Brasil, shows no Peru e Chile, sendo cancelada uma única apresentação que ocorreria em Bogotá, Colômbia), sendo três shows no território nacional (Rio de Janeiro, Curitiba e São Paulo, nesta ordem), com a designação Men At Work. Colin  é o único membro original (de fato, membro-fundador) e foi acompanhado de uma excelente banda formada pela esposa, a cantora Cecilia Noël no backing vocals e percussão; Scheila Gonzalez, saxofonista, tecladista, flautista e percussionista; San Miguel Perez na guitarra solo e backing vocals; Yosmel Montejo, no baixo e backing vocals; e Jimmy Branly, na bateria e percussão.

 

Em Curitiba, o show analisado foi realizado no dia 20 de fevereiro para uma esfuziada plateia que lotou a Live Curitiba, local do evento. A sinergia foi tão significativa que era visível a satisfação e alegria da banda, como um todo. Mesmo com apenas três álbuns, sendo o último lançado há quase quarenta anos, as canções se mantêm vívidas e presentes, como se pertencessem a um catálogo mais recente.

 

Mesmo com alguns minutos de atraso para o início da apresentação, o que ocasionou alguma apreensão e ansiedade percebida em parte da plateia, a expectativa foi atendida e mesmo superada, sem dúvidas. Com dezenove canções, os principais hits foram mesclados com canções da carreira solo de Colin Hay, coerentemente. A iluminação cênica, principal objeto de análise, mesmo com uma configuração predominantemente simétrica, proporcionou dinâmicas e atratividade, conforme será complementado, na sequência.

 

 


Aspecto da “South American Tour” da banda australiana Men At Work (Live Curitiba - (20/02/2024). Fonte: Cezar Galhart

 

 

Nas duas primeiras canções, “Touching the Untouchables” (do primeiro álbum Business as Usual, de 1982) e “No Restrictions” (do álbum Cargo, de 1983), luzes mais sóbrias e uniformes, predominantemente azuis e estáticas, estabeleceram um contexto mais nostálgico e fiel à visualidade dos shows que apresentaram a banda ao cenário musical mundial, no início da década de 1980, com fachos também azulados, em uma composição monocromática. Na continuidade, duas canções da carreira solo – “Come Tumblin’ Down” (do álbum Fierce Mercy, de 2017) e “Can’t Take This Town” (de Peaks & Valleys, lançado em 1992), introduziram fachos com variações de intensidade do âmbar, em contrastes bem definidos e circulares.

 

Foi em uma sequência de faixas mais conhecidas, com “Down by the Sea” (também do debut, Business as Usual, de 1982), “Everything I Need” (única do terceiro álbum Two Hearts, 1985, e que fez um significativo sucesso no Brasil), “Blue for You” (Cargo, de 1983) e “I Can See It in Your Eyes” (também de Business as Usual) que a iluminação cênica passa de contextos mais sutis e delicados para uma erupção visual, com luzes em cores vívidas, quentes, e tão ou mais dominantes. Estabelecia-se a partir desse bloco uma ruptura sonora e visual, com a adição de efeitos e novos elementos, com luzes móveis e intensas.

 

Na execução de “Dr. Heckyll & Mr. Jive” e “No Sign of Yesterday”, ambas de Cargo (1983), uma retomada nas transições sutis e padrões mais uniformes e monocromáticos, em preparação para uma nova sequência de canções arrebatadoras, com “Who Can It Be Now?”, “Underground” e “Catch a Star” (todas de Business as Usual, de 1982), evocando as sonoridades mais marcantes e que evidenciam a estética sonora da banda. Se uma das funções da iluminação cênica reside justamente no destaque, coube a esse momento um realce efetivo, enfático e pontual, com luzes brancas dirigidas e verticalizadas, contextualizando os pilares que sustentam os elementos visuais e sonoros dessa emblemática banda.

 

 

 


Aspecto da “South American Tour” da banda australiana Men At Work (Live Curitiba - (20/02/2024). Fonte: Thales Beraldo

 

 

Para encerrar o repertório principal, “Upstairs in My House”, “It's a Mistake” (todas de Cargo, de 1983), tendo a conhecidaDown Under” do álbum de estreia, estendida com improvisos e solos incidentes para a apresentação dos músicos que acompanham Colin Hay nesta turnê. Por se tratar do momento mais esperado – com  dois dos hits mais apreciados pelos fãs – a iluminação proporcionou um encerramento apoteótico, intenso, fascinante.

 

 

No bis, após a entoação do característico “parabéns” mas em um formato “bilingue” (cantado em inglês com trechos na língua portuguesa) em celebração do aniversário do produtor do espetáculo, as canções “Into My Life” (do álbum solo Wayfaring Sons, de 1990, e possivelmente, a mais conhecida do trabalho de Colin Hay), finalizando com outra canção entoada a plenos pulmões pela plateia “Be Good Johnny” (faixa que também integra o álbum Business as Usual, de 1982). Mais uma vez, contrastes nas formas e na composição visual do palco, com luzes brancas sequenciadas, intensas, dinâmicas.

 

 

 


Aspecto da “South American Tour” da banda australiana Men At Work (Live Curitiba - (20/02/2024). Fonte: Thales Beraldo

 

 

Em um espetáculo que prezou pela satisfação dos diversos e heterogêneos públicos, não somente se destacaram o entrosamento, preciosismo e fidelidade aos arranjos originais, como diversos momentos de improviso e reconhecimento aos talentos dos músicos, generosamente valorizados pelo protagonista principal, Colin Hay, como pela produção elogiável, impactante, impecável.

 

Abraços e até a próxima conversa!

 

 

Men at Work em Curitiba
Cezar Galhart

COMENTÁRIOS

O capacitor envelhece em um equipamento pouco usado também? Ou ele degrada principalmente com o uso? Por exemplo, um equipamento da década de 80 muito pouco usado precisaria de recap por desgaste do tempo?

- Henrique M

Ótimo, vai ajudar muito! Cesar é fantástico, ótima matéria!

- adriano vasque da

Saudades da Paranoia saudável que tínhamos no Freeeeeee Jazzzzzz Festival (imitando Zuza em suas apresentações magnificas) Parabéns Farat Forte abraço

- Ernani Napolitano

Artigo incrivel! Extremamente realista e necessário, obrigado mestre!

- Jennifer Rodrigues

Depois de 38 anos ouvindo o disco, eis q me deparo com a história dele. Multo bom!! Abrss

- Fernando Baptista Junqueira

Que maravilha de matéria, muito verdadeira é muito bem escrita, quem viveu como eu esta época, só pode agradecer pela oportunidade que Deus me concedeu. Vou ler todas, mas tinha que começar por esta… abraços…

- Caio Flávio

Só li verdades! Parabéns pela matéria Farat

- Guile

Ótimo texto Zé parabéns !!!!! Aguardando os próximos!!!

- Marco Aurélio

Adoro ver e rever as lives do Sá! Redescobri várias músicas da dupla valorizadas pela execução nas "Lives do Sá". Espero que esse trabalho volte de vez em quando. O Sá, juntamente com o Guilherme Arantes e o Tom Zé, está entre os melhores contadores de casos da MPB. Um livro com a história da dupla/trio escrito por ele seria muito interessante!

- Bruno Sander

Ontem foi um desses dias em que a intuição está atenta. Saí a caminhar pela Savassi sabendo que iria entrar naquela loja de discos onde sempre acho algo precioso em vinil. Já na loja, fui logo aos brasileiros e lá estavam o Nunca e o Pirão de Peixe em ótimo estado de conservação, o que é raríssimo. Comprei ambos. O 2º eu já tinha, meio chumbado. O Nunca eu conhecia de CD, e tem algumas das músicas que mais gosto da dupla, p. ex. Nuvens d'Água (acho perfeita), Coisa A-Toa (alusão à ditadura?), e outras. Me disseram que o F. Venturini é fã do Procol Harum, e realmente alguns solos de órgão dele fazem lembrar a banda inglesa.

- João Henrique Jr.

Que maravilha de matéria. Me transportei aos anos de ouro da música brasileira

- Sidney Ribeiro

Trabalho lindão. Parabéns à todos os envolvidos!

- Anderson Farias de Melo

O que dizer do melhor disco da música nacional(minha opinião). Tive o prazer em ver eles como dupla e a volta como trio em um shopping da zona leste de sampa. Lançamento do disco outra vez na estrada. Espero poder voltar a vê-los novamente, já que o Sa hoje mora fora do Brasil. E essa Pandemia, que isolou muito as pessoas. Obrigado por vocês existirem como músicos, poetas e instrumentistas. Vocês são F..., Obrigado, abracos

- Luiz antonio Rocha

Que maravilha Querido Paulinho Paulo Farat!! Obrigado por dividir conosco momentos tão lindos , pela maravilha de pessoa e imenso talento que Vc sempre teve, tem e terá, sempre estará no lugar certo e na hora certa ! Emocionante! Tive a honra de trabalhar muitas vezes com Vc, em especial na época do Zonazul , obrigado por tudo, parabéns pela brilhante carreira e que Deus Abençõe sempre . Bjbj

- Michel Freidenson

Mais uma vez um texto sensacional sobre a história da música e dos músicos brasileiros. Parabéns primo e obrigado por manter viva a memória dessas pessoas tão especiais para nós E vai gravar o vídeo desta semana! Kkkk

- Carlos Ronconi

Grande Farat!!! Bacana demais a coluna! Cheio de boas memorias pra compartilha!!!

- Luciana Lee

Valeu Paulo Farat por registrar nosso trabalho com tanto carinho e emoção sincera. Foram momentos profissionais muito importantes para todos nós. Inesquecíveis ! A todos os membros de nossa equipe,( e que equipe! ) Nosso Carinho e Saudades ! ???? ???????????????????? Guilherme Emmer Dias Gomes Mazinho Ventura Heitor TP Pereira Paulo Braga Renato Franco Walter Rocche Hamilton Griecco Micca Luiz Tornaghi Carlão Renato Costa Selma Silva Marilene Gondim Cláudia Zettel (in memoriam) Cristina Ferreira Neuza Souza

- Alberto Traiger

Depois de um ano de empresa 3M pude fazer o bendito carnê e comprei uma vitrolinha (em 12X) e na mesma hora levei Pirão, Quatro (Que era o novo), Es´pelho Cristalino e Vivo do Alceu, fiquei um ano ouvindo e pirando sem parar, depois vi o show do Quatro em Campinas. Considero o mais equilibrado de todos, sendo que sempre pendendo pro rural e nem tanto pro urbano, um disco atemporal podendo ser ouvido em qualquer situação, pois levanta o astral mesmo. No momento, Chuva no campo é ''a favorita'', mas depois passa e vem outra, igualzinho à aquela banda de Liverpool, manja????

- Ademilson Carlos de Sá

B R A V O!!! Paulo Farat não esqueça: “Afina isso aí moleque!” Hahahaha Tremendo profissional, sou teu fã, Grande abraço!

- Dudu Portes

Show é sensacional. Mas a s sensação intimista de parecer que a live é um show particular, dentro da sua casa, do seu quarto, é impagável. Parabéns família, incluindo Guarabyra e Tommy...

- Ricardo Amatucci

Paulo Farat vai esta nas lives do Papo Na Web a partir de amanha apresentando "Os Albuns Que Marcaram As Nossas Vidas"" Não percam, www.facebook.com/depaponaweb todas as terças-feiras as 20:00 horas

- Carlos Ronconi

Caro Luiz Carlos Sá, as canções que vocês fazem são maravilhosas, sinto a energia de cada uma. Tornei-me um admirador do trabalho de vocês no final dos anos 1970 com o LP Quatro e a partir de então saí procurando os discos de vocês, paguei um preço extorsivo pelo vendedor, os LP's "Casaco Marrom" do Guarabyra e "Passado, Presente e Futuro" (primeiro do Trio), mas valeu. tenho todos em LP's e CD's até o Antenas, depois desse só em CD's e o DVD "Outra Vez Na Estrada" exceto o mais recente "Cinamomo" mas em breve estarei com ele para curtir. A última vez que vi um show da dupla (nunca vi o trio em palco), foi no Recife no dia 16/04/2016 na Caixa Cultural, vi as duas apresentações. Levei dois bolos de rolo pra vocês, mas o Guarabyra não estava. Quero registrar que tenho até o LP "Vamos Por Aí", todos autografados, que foi num show feito no Teatro do Parque, as apresentações seriam nos 14,15 e 16/10/1992 mas o Guarabyra perdeu o voo e só foram dois dias, no dia do seu aniversário e outro no dia 16. Inesquecível. Agora estou lendo essas crônicas maravilhosas. Grande abraço forte e fraterno e muita saúde e sucesso pra vocês, sempre. P.S. O meu perfil no Facebook é Xavier de Brito e estou lá como Super Fã.

- Edison Xavier de Brito

Me lembro de ter lido algumas destas crônicas dos discos quando voce as publicou no Facebook em 2013, Sá. Muito emocionante reler e me emocionar de novo. Voces foram trilha sonora importantíssima dos últimos anos da minha vida. Sou de 1986, portanto de uma geração mais nova que escuta voces. Gratidão e vida longa a voces!

- Luiz Fernando Lopes

Salve!!! Que maravilha conhecer essas histórias de discos que fazem parte da minha vida. Parabéns `à Backstage e ao Sá! E, claro, esperando a crônica do Pirão. Esse disco me acompanha há mais de quarenta anos! Minhas filhas escutaram desde bebês e minha neta, que vai nascer agora em setembro, vai aprender a cantar todas as músicas!

- Maurício Cruz

com esse time de referências musicais (exatamente as minhas) mais o seu talento, não tem como não fazer música boa!!!! parabéns!!! com uma abraço de um fã que ouve seus discos desde essa época!

- nico figueiredo

Boa noite amigo, gostei muito das suas explicações, pois trabalho com mix gosto muito mesmo e assistindo você falando disso tudo gostei muito um abraço.

- Rubens Miranda Rodrigues

Obrigado Sá, obrigado Backstage, adoro essas histórias, muito bom, gostaria de ouvir histórias sobre as letras tbém, abç.

- Robson Marcelo ( Robinho de Guariba SP )

Esperando ansioso o Pirão de Peixe e o 4. Meu primeiro S&G

- Jeferson

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