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COLUNISTAS

Homenagem a David Crosby

20/01/2023 - 15:26h
Atualizado em 20/01/2023 - 15:33h



Fotos: Divulgação / Arquivo / Taylor Jewell / INvision / AP

 

Lá pelos 70, enquanto começávamos a pensar no que futuramente seria chamado pela mídia de “rock rural”, eu, Zé Rodrix e Guarabyra passávamos tardes inteiras num apartamento de Ipanema ouvindo em volume máximo - através de portentosas caixas de concreto (sim, concreto, cimento...) que abrigavam quatro falantes Wharfdale de 18 polegadas e alguns tweeters menos votados - um trio norte-americano folk recém chegado aos nossos ouvidos. Enquanto nos enredávamos pelos vocais elusivos do trio, que transformava melodias enganosamente simples em fascinantes jogos harmônicos, o apartamento 101 da rua Alberto de Campos, 111, balançava ao som de Crosby, Stills & Nash. Quando decidimos enfim ser um trio, chegamos à conclusão que a melhor homenagem aos que nos inspiraram no quesito “rock” - porque a parte “rural” cavamos fundo no fértil chão brasileiro – seria, como eles o fizeram, juntar nossos sobrenomes, um monossílabo, um dissílabo e um polissílabo. Daí o Sá, Rodrix & Guarabyra.

 

Anos depois, já na segunda década do novo século, recebo um telefonema do amigo Gegê Lara, empresário musical mineiro e meu parceiro desde o começo de nossa carreira, profundo conhecedor de meus gostos e desgostos:

 

- Estou trazendo Crosby, Stills & Nash aqui pra BH. Quer ir?

Tremi ao celular como um estreante cantando para uma multidão.

-Isso é sério? eles vêm mesmo?

 

Mas antes que pudesse raciocinar, entrei numa nuvem pelo resto da semana e acabei por me ver ao lado dele, Gegê, num mezanino reservado nas alturas do ginásio Marista, desacreditando de meus ouvidos que escutavam “Marrakesh Express” ao vivo , por seus criadores originais.

 

Quando consegui voltar a mim, Gegê me carregava escadas abaixo, ao som do último bis:

 

- Vamos falar com eles.

 


Nash & Stills

 

Tenho até hoje incrustrada em mim como uma craca cortante de um litoral traiçoeiro essa alma jornalística que me atacou antes mesmo que a música. Enquanto despencava rumo ao camarim do trio, pensava desesperadamente no que ia falar com eles. Pareceria idiota dizer que nos espelhamos em seus sobrenomes? Ficaria bem perguntar por Neil Young, que passou um bom período fazendo do trio um quarteto? Aperto as mãos? Abraço e juro eterna devoção ao que eles fizeram? Explico em detalhes como aqueles meses de CSN no apartamento de Ipanema mudaram meus rumos musicais? Tarde demais. A porta se abriu e eu estou diante de Stephen Stills e Graham Nash. Cadê o Crosby? Antes que eu pudesse abrir a boca, Gegê convocou o fotógrafo e tiramos uma foto. Engatei um papo com Nash e cantei para ele um trecho de “Our House”, música que ele escreveu para minha não menos ídola Joni Mitchell. Reparei que Stills olhava aquilo tudo como se estivesse em outra dimensão. Nash reparou minha estranheza e explicou:

 

- Não liga não, Steve já tirou o aparelho auditivo. Ele não tá escutando nada.

"Então” – pensei – “como Beethoven, um de meus compositores e guitarristas preferidos é surdo como uma porta...”  

 

Outras pessoas entraram pelo camarim e eu me despedi dos dois. Fui para a antessala, onde Crosby estava, conversando com as pessoas que o cercavam. Quando eu perguntara pelo motivo da ausência de Crosby durante uma boa parte do show, Nash me dissera que ele estava se recuperando de problemas de saúde e precisava de um descanso de vez em quando. As loucuras dos anos 70 cobram até hoje sua amarga conta de muitos de nós, sejamos quem sejamos, vivamos onde quer que sobrevivamos.

 

No final das contas Gegê juntou todos nós e comandou uma foto coletiva. Hoje, ao receber a notícia da morte de Crosby, procurei essa foto e não achei. Só encontrei a minha com Stills e Nash.

 

As gerações que me influenciaram estão partindo. Mas aí penso nos benefícios da internet, que eterniza sons, imagens e desejos para todo o sempre. Como é boa a modernidade. Como é bom poder tocar um instrumento.

 

Crosby, você me deve uma foto. Mas sua dívida está pra lá de paga pelo que eu ouvi da sua voz, da sua guitarra, das suas composições.

 


Crosby é o segundo da esquerda para a direita

 

 

Homenagem a David Crosby
Luiz Carlos Sá

COMENTÁRIOS

O capacitor envelhece em um equipamento pouco usado também? Ou ele degrada principalmente com o uso? Por exemplo, um equipamento da década de 80 muito pouco usado precisaria de recap por desgaste do tempo?

- Henrique M

Ótimo, vai ajudar muito! Cesar é fantástico, ótima matéria!

- adriano vasque da

Saudades da Paranoia saudável que tínhamos no Freeeeeee Jazzzzzz Festival (imitando Zuza em suas apresentações magnificas) Parabéns Farat Forte abraço

- Ernani Napolitano

Artigo incrivel! Extremamente realista e necessário, obrigado mestre!

- Jennifer Rodrigues

Depois de 38 anos ouvindo o disco, eis q me deparo com a história dele. Multo bom!! Abrss

- Fernando Baptista Junqueira

Que maravilha de matéria, muito verdadeira é muito bem escrita, quem viveu como eu esta época, só pode agradecer pela oportunidade que Deus me concedeu. Vou ler todas, mas tinha que começar por esta… abraços…

- Caio Flávio

Só li verdades! Parabéns pela matéria Farat

- Guile

Ótimo texto Zé parabéns !!!!! Aguardando os próximos!!!

- Marco Aurélio

Adoro ver e rever as lives do Sá! Redescobri várias músicas da dupla valorizadas pela execução nas "Lives do Sá". Espero que esse trabalho volte de vez em quando. O Sá, juntamente com o Guilherme Arantes e o Tom Zé, está entre os melhores contadores de casos da MPB. Um livro com a história da dupla/trio escrito por ele seria muito interessante!

- Bruno Sander

Ontem foi um desses dias em que a intuição está atenta. Saí a caminhar pela Savassi sabendo que iria entrar naquela loja de discos onde sempre acho algo precioso em vinil. Já na loja, fui logo aos brasileiros e lá estavam o Nunca e o Pirão de Peixe em ótimo estado de conservação, o que é raríssimo. Comprei ambos. O 2º eu já tinha, meio chumbado. O Nunca eu conhecia de CD, e tem algumas das músicas que mais gosto da dupla, p. ex. Nuvens d'Água (acho perfeita), Coisa A-Toa (alusão à ditadura?), e outras. Me disseram que o F. Venturini é fã do Procol Harum, e realmente alguns solos de órgão dele fazem lembrar a banda inglesa.

- João Henrique Jr.

Que maravilha de matéria. Me transportei aos anos de ouro da música brasileira

- Sidney Ribeiro

Trabalho lindão. Parabéns à todos os envolvidos!

- Anderson Farias de Melo

O que dizer do melhor disco da música nacional(minha opinião). Tive o prazer em ver eles como dupla e a volta como trio em um shopping da zona leste de sampa. Lançamento do disco outra vez na estrada. Espero poder voltar a vê-los novamente, já que o Sa hoje mora fora do Brasil. E essa Pandemia, que isolou muito as pessoas. Obrigado por vocês existirem como músicos, poetas e instrumentistas. Vocês são F..., Obrigado, abracos

- Luiz antonio Rocha

Que maravilha Querido Paulinho Paulo Farat!! Obrigado por dividir conosco momentos tão lindos , pela maravilha de pessoa e imenso talento que Vc sempre teve, tem e terá, sempre estará no lugar certo e na hora certa ! Emocionante! Tive a honra de trabalhar muitas vezes com Vc, em especial na época do Zonazul , obrigado por tudo, parabéns pela brilhante carreira e que Deus Abençõe sempre . Bjbj

- Michel Freidenson

Mais uma vez um texto sensacional sobre a história da música e dos músicos brasileiros. Parabéns primo e obrigado por manter viva a memória dessas pessoas tão especiais para nós E vai gravar o vídeo desta semana! Kkkk

- Carlos Ronconi

Grande Farat!!! Bacana demais a coluna! Cheio de boas memorias pra compartilha!!!

- Luciana Lee

Valeu Paulo Farat por registrar nosso trabalho com tanto carinho e emoção sincera. Foram momentos profissionais muito importantes para todos nós. Inesquecíveis ! A todos os membros de nossa equipe,( e que equipe! ) Nosso Carinho e Saudades ! ???? ???????????????????? Guilherme Emmer Dias Gomes Mazinho Ventura Heitor TP Pereira Paulo Braga Renato Franco Walter Rocche Hamilton Griecco Micca Luiz Tornaghi Carlão Renato Costa Selma Silva Marilene Gondim Cláudia Zettel (in memoriam) Cristina Ferreira Neuza Souza

- Alberto Traiger

Depois de um ano de empresa 3M pude fazer o bendito carnê e comprei uma vitrolinha (em 12X) e na mesma hora levei Pirão, Quatro (Que era o novo), Es´pelho Cristalino e Vivo do Alceu, fiquei um ano ouvindo e pirando sem parar, depois vi o show do Quatro em Campinas. Considero o mais equilibrado de todos, sendo que sempre pendendo pro rural e nem tanto pro urbano, um disco atemporal podendo ser ouvido em qualquer situação, pois levanta o astral mesmo. No momento, Chuva no campo é ''a favorita'', mas depois passa e vem outra, igualzinho à aquela banda de Liverpool, manja????

- Ademilson Carlos de Sá

B R A V O!!! Paulo Farat não esqueça: “Afina isso aí moleque!” Hahahaha Tremendo profissional, sou teu fã, Grande abraço!

- Dudu Portes

Show é sensacional. Mas a s sensação intimista de parecer que a live é um show particular, dentro da sua casa, do seu quarto, é impagável. Parabéns família, incluindo Guarabyra e Tommy...

- Ricardo Amatucci

Paulo Farat vai esta nas lives do Papo Na Web a partir de amanha apresentando "Os Albuns Que Marcaram As Nossas Vidas"" Não percam, www.facebook.com/depaponaweb todas as terças-feiras as 20:00 horas

- Carlos Ronconi

Caro Luiz Carlos Sá, as canções que vocês fazem são maravilhosas, sinto a energia de cada uma. Tornei-me um admirador do trabalho de vocês no final dos anos 1970 com o LP Quatro e a partir de então saí procurando os discos de vocês, paguei um preço extorsivo pelo vendedor, os LP's "Casaco Marrom" do Guarabyra e "Passado, Presente e Futuro" (primeiro do Trio), mas valeu. tenho todos em LP's e CD's até o Antenas, depois desse só em CD's e o DVD "Outra Vez Na Estrada" exceto o mais recente "Cinamomo" mas em breve estarei com ele para curtir. A última vez que vi um show da dupla (nunca vi o trio em palco), foi no Recife no dia 16/04/2016 na Caixa Cultural, vi as duas apresentações. Levei dois bolos de rolo pra vocês, mas o Guarabyra não estava. Quero registrar que tenho até o LP "Vamos Por Aí", todos autografados, que foi num show feito no Teatro do Parque, as apresentações seriam nos 14,15 e 16/10/1992 mas o Guarabyra perdeu o voo e só foram dois dias, no dia do seu aniversário e outro no dia 16. Inesquecível. Agora estou lendo essas crônicas maravilhosas. Grande abraço forte e fraterno e muita saúde e sucesso pra vocês, sempre. P.S. O meu perfil no Facebook é Xavier de Brito e estou lá como Super Fã.

- Edison Xavier de Brito

Me lembro de ter lido algumas destas crônicas dos discos quando voce as publicou no Facebook em 2013, Sá. Muito emocionante reler e me emocionar de novo. Voces foram trilha sonora importantíssima dos últimos anos da minha vida. Sou de 1986, portanto de uma geração mais nova que escuta voces. Gratidão e vida longa a voces!

- Luiz Fernando Lopes

Salve!!! Que maravilha conhecer essas histórias de discos que fazem parte da minha vida. Parabéns `à Backstage e ao Sá! E, claro, esperando a crônica do Pirão. Esse disco me acompanha há mais de quarenta anos! Minhas filhas escutaram desde bebês e minha neta, que vai nascer agora em setembro, vai aprender a cantar todas as músicas!

- Maurício Cruz

com esse time de referências musicais (exatamente as minhas) mais o seu talento, não tem como não fazer música boa!!!! parabéns!!! com uma abraço de um fã que ouve seus discos desde essa época!

- nico figueiredo

Boa noite amigo, gostei muito das suas explicações, pois trabalho com mix gosto muito mesmo e assistindo você falando disso tudo gostei muito um abraço.

- Rubens Miranda Rodrigues

Obrigado Sá, obrigado Backstage, adoro essas histórias, muito bom, gostaria de ouvir histórias sobre as letras tbém, abç.

- Robson Marcelo ( Robinho de Guariba SP )

Esperando ansioso o Pirão de Peixe e o 4. Meu primeiro S&G

- Jeferson

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