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#tbt DVD dos Novos Baianos

15/04/2020 - 16:45h
Atualizado em 30/07/2020 - 10:40h

Esta semana perdemos Moraes Moreira. Por isso, o #TBT Backstage de hoje vai para esta reportagem sobre o último trabalho dos Novos Baianos, Acabou Chorare - Novos baianos se encontram, que saiu na edição impressa 272, de julho de 2017.

 

Reportagem: Miguel Sá | redacao@backstage.com.br | Fotos: Ernani Matos / Cult Magazine / Arena Audio / Internet / Divulgação

 

A reinauguração da Concha Acústica de Salvador trouxe também a volta dos Novos Baianos. O grupo lança um DVD com repertório calcado no disco Acabou Chorare.

 

 

Ao se abrir a porta da técnica do estúdio 2, na Cia dos Técnicos, já escapa a gravação de Pepeu Gomes tocando o riff da música Dê um rolé, também gravada por Gal Costa e, mais recentemente, ouvido em uma abertura de novela com a cantora Pitty. Paulinho Boca de Cantor, Moraes Moreira e Flávio Senna conversam sobre os últimos detalhes da mixagem antes de ir masterizar no dia seguinte, com Carlos Freitas, em São Paulo. Pepeu Gomes chegaria, pessoalmente, mais tarde para também conferir o som. O clima geral é de satisfação e missão cumprida. Depois de tanto tempo, o som dos Novos Baianos não perdeu o frescor. A intimidade musical dos integrantes, o som super presente das vozes de Paulinho Boca de Cantor, Moraes, Baby do Brasil e Luis Galvão; a guitarra de Pepeu, assim como a de Dadi que, como Didi Gomes também tocou baixo, além da bateria de Jorge Gomes, que fez a sessão rítmica com Gil Oliveira, filho de Paulinho Boca de Cantor, na percussão, mostrava toda a força nos monitores do estúdio. “Não é a fita, o vinil ou o CD que faz isso. É um jeito de tocar, um jeito de fazer”, ressalta Flávio Senna ao falar do som produzido pela banda.

 

 

Intimidade Musical
Esse “jeito”, no caso dos Novos Baianos, é relacionado à já conhecida história de como ensaiavam juntos o dia inteiro no sítio que moravam em Jacarepaguá, no Rio de Janeiro. Uma sonoridade que eles passaram anos construindo juntos de forma intensiva. Por isso, não foi difícil voltarem ao entrosamento antigo em apenas três dias de ensaio, antes da reestreia na Concha Acústica, em maio de 2016. “Foi totalmente mágico. Com meia hora já parecia que a gente não tinha estado longe um do outro”, conta Paulinho. “Claro que, depois de quase vinte anos sem fazer show juntos, a cada um que fazíamos ia ficando melhor, como um jogador de futebol que fica muito tempo parado e precisa recuperar o ritmo. Hoje o show está ainda melhor que o primeiro que fizemos no reencontro”, acrescenta Moraes Moreira, lembrando de quando se juntaram, em fins dos anos 1990, para o CD Infinito Circular.


Após chegar e conferir o som, Pepeu lembra de como surgiu o projeto do DVD/CD    Acabou chorare: os novos baianos se encontram. “Até então tínhamos nos juntado apenas para o show na Concha Acústica. Mas aí começaram a aparecer os pedidos de show. Decidimos começar uma turnê e aí vimos a legião de fãs que nos acompanhavam. Sabíamos, claro, da importância da história dos Novos Baianos, mas não tínhamos a dimensão disso. Atribuo isso à boa música que os Novos Baianos fazem”, aponta o guitarrista. Foi então que apareceu o convite da gravadora Som Livre para o projeto.
O próprio Pepeu Gomes foi encarregado de escolher quem gravaria o show. Flávio Senna foi chamado. 

 

 

Gravando...
Na química do trabalho também está presente, é claro, o toque do engenheiro de gravação e mixagem. Flávio Senna, além de ser um profissional requisitado e premiado, tem uma relação afetiva forte com o trabalho dos Novos Baianos. O irmão, Eustáquio Senna, compositor e produtor musical falecido em 2007, foi um dos produtores de Acabou Chorare, que foi considerado, a partir de votação promovida pela revista Rolling Stone o melhor álbum brasileiro. Além da produção, com João Araújo, do LP  lendário dos Novos Baianos - Eustáquio trabalhou como produtor na Elenco e na Som Livre. Também compôs canções com nomes como Marcos Valle e Zé Ramalho e lançou um LP próprio, Cauromi, em 1982. “Esse disco dos Novos Baianos me marcou muito. Eu era muito próximo do meu irmão, e esse disco representou muito para ele. Quando recebi o telefonema do Pepeu, falei o quanto ficava honrado e feliz com o convite”, relembra Flávio.

 


A gravação no Metroppolitan aconteceu no dia 17 de março de 2017. Apenas três ou quatro músicas foram regravadas no bis. “A Gabisom me forneceu o setup que estou acostumado a trabalhar. Usei um camarim como técnica, com uma mesa Amek Recall com prés da Neve, mais alguns prés externos à mesa para os microfones de ambiente”, detalha Flávio, que gravou tudo usando o Pro Tools HDX. Para as vozes, foram usados microfones novos da Shure. “Microfone bom é microfone com cápsula nova. Os que estão na estrada caem, pegam umidade, fumaça, então a resposta de uma capsula nova é sempre melhor”, completa.


O palco teve monitores de chão e sidefill, além de amplificadores de guitarra, o que o tornava mais ruidoso do que costuma acontecer hoje em dia, quando muitos instrumentos são gravados em linha e se costuma usar, apenas, monitoração in-ear. “Todo mundo usou tudo o que tinha para se ouvir. Inclusive in-ear”, conta Flávio Senna. Os músicos só usaram o click na contagem inicial. As músicas transcorriam no andamento normal dos músicos da banda. “É esse o tempero que eles têm. A música flui e eles deixam isso acontecer. Não sei como eles conseguem fazer isso com precisão”, se diverte o técnico de som. 
O ambiente é sempre fundamental em uma gravação ao vivo. Senna usou doze pares de microfones, entre shotguns da Sennheiser e da Neumann. “Esse é um áudio que não tem como ensaiar. Por isso, sou daqueles que enche o ambiente de microfones para depois escolher. Não usei todos o tempo inteiro, mas tinham canções que o grupinho de trás sabia inteira, e o da frente não. Então gravamos, escolhemos e depois, na mixagem, acertamos o atraso do grupo em relação ao palco”, detalha o engenheiro de som. 

 

 

… Mixando...
Mixar uma gravação ao vivo é como uma reconstrução. O som é captado, dividido em vários canais e depois levado ao estúdio para ser reconstruído de forma a passar, de forma verossímil, o que aconteceu no dia da gravação. É preciso que não se limpe demais o som. Para timbragem e ajustes, Flavio Senna lançou mão do setup habitual com o qual trabalha na Cia dos Técnicos “Na bateria usei a Lexion 300 para a caixa e o TC Electronics 2290 para os tambores”, detalha. Para baixo e bumbo, ele usou um efeito mais curto no Harmonizer H3000. Também para baixo e bumbo foi usado o compressor Universal Audio LA3A. As guitarras de Pepeu e Dadi já chegaram com os timbres prontos. “Usei só um pouco da equalização de mesa da Euphonix mesmo. Elas já vieram com a compressão e todos os drives. Em algumas, com um agudinho um pouco mais presente, usei uma equalização com um Q bem fico para ajustar”, conta o técnico de som.

 


Segundo Flávio Senna, não foi necessário fazer nenhum overdub de vozes. Apenas na guitarra de Pepeu Gomes aconteceu um problema em um dos dois amplificadores que o guitarrista usou no show que provocou a reamplificação de um dos canais na própria performance ao vivo do guitarrista. “Liguei o amplificador na sala de gravação e usei um efeito do H3000”, indica. As gravações adicionais foram feitas por Flávio Senna Neto.

 


Nas vozes, aconteceram algumas microfonias, excesso de vazamento dos monitores ou outros ruídos indesejáveis. “Nesse caso, limpamos usando alguma equalização com automação apenas no trecho, ou substituindo o trecho por outro, ou mesmo invertendo a fase. São aquelas coisinhas que a tecnologia permite”, detalha Senna, que recebeu o auxílio de Daniel Alcoforado nas edições.


A mixagem do trabalho dos Novos Baianos é para CD e DVD, portanto há uma versão 2.0 e outra 5.1. Flávio Senna faz primeiro a mixagem 2.0. Depois, na 5.1, é só reorganizar o espaço dos instrumentos e compensar as perdas que ocorrem no desacoplamento que acontece entre os instrumentos. “Quando você espalha os instrumentos, perde um pouco da pressão. Para minimizar isso, faço sempre uma comparação entre o estéreo do 2.0 e o do 5.1”, ensina.


Ao realocar a voz no sistema 5.1, Flávio coloca cerca de 30% dela no centro, mas continua priorizando o posicionamento no estéreo. “Em geral, não tem um 5.1 configurado corretamente na casa das pessoas. Tem gente que coloca a caixa de centro atrás da TV, por exemplo. Ou então que essa mesma caixa é menor que as outras. Aí, quando aumenta o volume, ela distorce. Temos que fazer algo pensando em quem tem aquele sistema bem bacana e também naquele pequenininho”, define.


Flávio Senna celebra a tecnologia e o quanto ela ajuda a fazer uma gravação ao vivo.  As facilidades e condições de gravação tornaram o palco um verdadeiro “palco estúdio”, talvez melhor que os home studios quando se trata de ter as melhores condições para gravar um som. “Claro que tem coisas bacanas, bem feitas. Mas, se não tomar cuidado, ao vivo fica melhor que no estúdio. Os estúdios estão pequenos, as salas estão soando mal, as pessoas gravam bateria em lugares que não daria para gravar bem nem caixa de fósforo. Com certeza um lugar do tamanho do Metropolitan vai soar melhor que o banheiro de casa. Gravar ao vivo está fácil pela tecnologia, pelos microfones, pelos prés maravilhosos e pelo tamanho das salas que se usa em estúdios”, conclui.

 

 

… Masterizando...
Na forma que Caros Freitas trabalha, a masterização é feita para vários dos meios onde a música pode ser executada. Da gravação dos Novos Baianos, foram feitas versões para  CD,  Spotify, iTunes MFiT e DVD 2.0 e 5.1. “Para o CD, o Pepeu quis um som um pouco mais comprimido para se obter um volume geral mais alto. Para o Spotify e iTunes MFiT eu fiz a master respeitando os novos padrões de RMS exigidos pelas plataformas e, para o DVD, a master tradicional. O meu objetivo é que a sonoridade seja a mesma em cada mídia”, define o engenheiro de masterização. 

 


O trabalho de Carlos Freitas seguiu uma orientação geral, pensando em um som uniforme para momentos, instrumentos e vozes distintas no decorrer do show. “Antes de começarmos o trabalho de masterização, o Pepeu me disse que o projeto tinha dois estilos distintos, o acústico e o elétrico, com instrumentações diferentes como violão e guitarra, por exemplo, além de ter quatro cantores diferentes. Ele gostaria que a pressão sonora fosse bem parecida e que não houvesse diferença entre os estilos. Isso me levou a dividir o projeto em dois blocos. Na parte elétrica, eu usei os equalizadores Dangerous BAX EQ e Maselec e o compressor Dangerous. Para a parte acústica eu usei os mesmos equalizadores, mas troquei o compressor Dangerous pelo Manley. No final, consegui um bom equilíbrio de frequências e uma uniformidade de volume e pressão entre as músicas e estilos”, detalha.

 


Por conta da certeza que o técnico precisa ter sobre o que está ouvindo, já que é o último estágio antes que os fonogramas sejam executados, a monitoração, para Carlos Freitas, é a principal ferramenta nesse estágio da produção de uma música. “Você precisa ter certeza do que está ouvindo, pois está tomando decisões que podem alterar o balanço sonoro de uma mixagem e, consequentemente, a estética da música”. No Classic Master ele usa dois sistemas de Monitoração: o B&W serie 700 (5.1) com amplificador ATI 2000 e o sistema de Fone Sennheiser HD 700 com amplificador Sennheiser HDV 800. “O critério da escolha foi ter um sistema de monitor equilibrado, transparente com baixíssima distorção”, estabelece Carlos.

 

 

… e Acabou Chorare
Paulinho Boca de Cantor tem carreira solo e trabalha, já há algum tempo, como pesquisador da música brasileira. Nos quase quarenta anos desde que saiu dos Novos Baianos, Moraes Moreira tem discos de ouro e inúmeros sucessos tanto na sua voz como na de intérpretes como Gal Costa e Ney Matogrosso. Pepeu Gomes é uma lenda e referência da guitarra brasileira, com discos instrumentais e também de canções, cantando solo ou, até meados dos anos 1980, em parcerias com Baby do Brasil – que foi reeditada com grande sucesso no Rock in Rio 2015. Baby, desde os anos 1990, converteu-se e se tornou pastora evangélica, mas não deixou de fazer músicas e shows com grande sucesso. O baixista Dadi e os irmãos de Pepeu: o também baixista Didi e o baterista Jorge continuam tocando e encantando com alguns dos melhores artistas do Brasil. Enfim, todos têm suas trajetórias vitoriosas. Mas parece que em alguns momentos é dada uma espécie de “toque de reunir”. Aí eles se juntam, tocam, e... “a menina ainda dança”.

 

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