Adefran Santana - informação, marketing e entretenimento
13/05/2025 - 22:39h
Atualizado em 16/05/2025 - 17:53h
Adefran começou no áudio ainda criança, na cidade natal de Vila Feijó (AC), quando conseguiu trabalho em uma rádio para ajudar a família. Atuando como locutor e sonoplasta, desenvolveu um olhar técnico e criativo para o som aprendendo a editar gravações de forma autodidata. Além do trabalho no rádio, conseguiu outro emprego em uma emissora de TV na parte de som direto e também como cabo-man.
Anos depois, já morando em Cascavel (CE), conciliou o trabalho no áudio com a faculdade de Física, cursada na Universidade Federal do Ceará, aprofundando seus conhecimentos e expandindo suas habilidades para tecnologia e produção musical. As atividades na área do áudio o que o levaram a identificar oportunidades na área de eventos.
Após anos no setor de eventos, a pandemia o levou a criar conteúdo digital e inovar nas transmissões ao vivo, conectando profissionais do áudio pelo mundo. Com mais de 60 mil seguidores no Instagram, e cerca de 37 mil em outras plataformas, o Inventor do “Mezzario”, personagem de memes que informam e divertem a partir do cotidiano do técnico de som, fala sobre o papel do marketing, humor e Internet no aprimoramento profissional.
Amigos que o áudio trouxe. Da esquerda pra direita, Marcelo Gratão e Tiago Borges.
Revista Backstage: Como a pandemia impactou seu trabalho?
Adefran: De forma drástica. Perdi dois terços da minha empresa. No início, banquei os funcionários do meu bolso, depois precisei vender equipamentos. Passei meses sem entrar no galpão da empresa. Além disso, vi muitos colegas do setor enfrentando situações desesperadoras. Foi um período muito difícil. Precisei me reinventar e buscar novas formas de continuar ativo no mercado.
Revista Backstage: Foi nesse contexto que você criou o Cascavel Lockdown?
Adefran: Sim. Muitos profissionais estavam passando dificuldades. Juntei técnicos, músicos e empresas da região para ajudar 40 famílias com cestas básicas e suporte. Fizemos lives e arrecadamos doações. O mais interessante foi ver que os artistas mais humildes foram os que mais ajudaram. Isso me fez valorizar ainda mais quem realmente faz a diferença. Também fiz lives com profissionais do áudio de vários países, transmitindo simultaneamente para Instagram, Facebook, YouTube e LinkedIn. Chegamos a ter transmissões com convidados do Brasil, Portugal, Inglaterra e até Israel, com tradução simultânea em tempo real.
Revista Backstage: Após a pandemia, você perdeu trabalho?
Adefran: Foi um momento complicado, porque eu percebi que as empresas que tinham condições de investir estavam dando prioridade para quem conseguiu renovar os equipamentos. Enquanto isso, eu estava tentando me reerguer, mas os eventos apareciam apenas de forma esporádica. Isso me fez refletir muito sobre o futuro e buscar outras formas de me manter ativo. A gente sempre acredita que o bem retorna rápido, mas a verdade é que tudo tem um tempo certo para acontecer. Como minha mãe dizia, “as coisas acontecem no tempo de Deus”. Foi justamente nesse período comecei a produzir vídeos para redes sociais.
Revista Backstage: Como foi o aprendizado para a criação de conteúdo digital?
Adefran: Tudo começou sem nenhuma pretensão. Eu sempre vi injustiças no setor, como quando o dono do evento paga a banda integralmente mas deixa o pessoal do som no prejuízo. Resolvi gravar um vídeo sobre isso e postei no Instagram. Fiz outro vídeo, depois mais um, e continuei, porque, na verdade, eu não tinha mais nada para postar sobre eventos, já que não estava trabalhando com a mesma frequência. Usei os vídeos como uma forma de ocupar a mente, mas de repente meu perfil começou a crescer muito, ganhando 400, 500 seguidores por dia. Quando percebi, os vídeos estavam viralizando e sendo compartilhados por profissionais de todo o Brasil.
Com técnicas de Maketing Digital, Adefran consegue levar entretenimento e informação.
Revista Backstage: O que você acha que fez seus vídeos se destacarem?
Adefran: Acredito que foi a forma como eu abordo as situações do mundo do áudio. Eu poderia simplesmente fazer vídeos sensacionalistas, mostrando acidentes ou situações trágicas, mas nunca quis esse caminho. Eu já perdi amigos que caíram de palco ou sofreram choques elétricos em eventos, sei como isso é traumático. Por isso meu foco sempre foi levar uma visão positiva e realista do nosso trabalho, sem explorar tragédias. Acho que foi essa pegada que fez o público se identificar e começar a compartilhar.
Revista Backstage: Quando você percebeu que seu personagem tinha realmente furado a bolha?
Adefran: Foi em um evento da SemanAudio, em São Paulo. Eu estava lá para fotografar, filmar e divulgar, mas, quando cheguei na entrada do evento, as pessoas começaram a me reconhecer. Vinham me cumprimentar, pedir para tirar foto, contar que acompanhavam meus vídeos. Algumas até falavam que os filhos ou as esposas compartilhavam os conteúdos com elas. Foi ali que percebi que o personagem tinha alcançado um público muito maior do que eu imaginava.
Revista Backstage: Como o personagem foi se desenvolvendo ao longo do tempo?
Adefran: O personagem nasceu naturalmente, mas tudo nele tem um significado. O boné é uma homenagem aos roadies, que sempre estão de boné no dia a dia do trabalho. A camisa preta com logo de empresas ou bandas é algo comum no nosso meio. O crachá é um símbolo dos eventos e feiras que participamos. Já os pendrives pendurados no pescoço são uma referência a um amigo técnico que sempre andava carregado deles para armazenar as cenas das mesas de som. O termo “mesário” era muito usado em algumas regiões do Brasil para se referir ao técnico de som, mas com o tempo acabou ganhando um tom pejorativo. Algumas pessoas começaram a se incomodar com essa nomenclatura, querendo ser chamadas de "engenheiro de áudio", por exemplo. Eu resolvi resgatar o termo de forma positiva, mostrando que o “Mezzario” é um cara apaixonado pelo som, que sempre dá um jeito de resolver qualquer problema e entrega o melhor resultado possível. Cada detalhe foi pensado para representar a realidade dos profissionais do áudio.
Revista Backstage: Além do humor, seus vídeos também trazem muita informação técnica. Isso é proposital?
Adefran: Sim, sempre foi minha intenção misturar humor com conteúdo técnico. Nos vídeos, eu insiro pequenas informações que fazem a diferença para quem entende do assunto. Quando falo sobre decibéis, aterramento ou normas técnicas, por exemplo, sempre coloco uma chamada para ação, incentivando a pesquisa. No final do vídeo, deixo um texto contextualizando a piada, explicando melhor o conceito técnico envolvido. Eu percebi que nem todo mundo consegue captar essas informações só pelo vídeo, então comecei a detalhar mais na legenda para garantir que o conhecimento seja absorvido.
Backstage – Com a criação desse personagem, o marketing no mundo do áudio passou a ser visto de uma forma diferente. Algo mais leve, não é?
Adefran – O personagem traz um humor positivo, mas há toda uma estratégia de marketing por trás dos vídeos. Se você observar, eu sempre apareço com um boné característico e cordões que exibem marcas que são minhas parceiras. As camisetas que uso também costumam ter uma marca estrategicamente posicionada no lado esquerdo. A angulação da câmera e a forma como apareço conversando seguem a regra dos terços, garantindo que essas marcas sejam notadas. Além disso, produtos aparecem inseridos na piada. Quando estou segurando uma caixa acustica ou uma régua de energia, aquilo também é um marketing de empresa. Há toda uma construção por trás. Quem é do meio do áudio reconhece o modelo do caixa acústica, a marca da régua de energia ou até a cápsula do microfone que estou usando apenas assistindo ao vídeo. O marketing do personagem funciona em camadas, assim como as piadas. A headline inicial muitas vezes já está conectada com a propaganda, e o texto final reforça isso. Na descrição do vídeo, costumo inserir informações técnicas, explicando como determinados produtos podem solucionar problemas do setor, como aterramento. Esse tipo de marketing se diferencia do que era feito antigamente porque não tem uma cara explícita de publicidade. Se fosse um vídeo tradicional dizendo “este Direct Box da marca tal é muito bom, compre!”, ninguém compartilharia. Mas, quando o produto está inserido no contexto da piada, o engajamento é natural e a empresa atinge seu público de forma mais eficaz. Outro aspecto importante do marketing que o personagem trouxe foi a visita às empresas. Viajo pelo país conhecendo fábricas de equipamentos de áudio e afins. Durante essas visitas, crio conteúdos que misturam humor e informação. Além disso, meu conhecimento técnico faz toda a diferença. Sou formado em Física, então, quando visito uma linha de produção, consigo criar piadas inteligentes baseadas em termos e aplicações técnicas. Não é um humor aleatório.
Backstage – É um humor com respeito pelo conhecimento então.
Adefran – Quem sabe de onde venho entende que o personagem é uma consequência de um conhecimento prévio, uma forma de alcançar um público maior sem perder a credibilidade. Certa vez, ao visitar uma fábrica de caixas acústicas, entrei no setor de desenvolvimento técnico, que é o mais avançado. O responsável técnico, Júlio Itiro, me recebeu dizendo que, ao saber da minha visita, pesquisou meu perfil no LinkedIn e descobriu que eu também tinha feito faculdade de Física. Ou seja, ele percebeu que, apesar do humor, há um embasamento técnico real por trás do meu trabalho. A atitude dele, de pesquisar no LikedIn, reforçou o que eu sempre falo para meus clientes de marketing de áudio: esteja sempre em todos os lugares digitais.
Backstage – Como é a sua abordagem do marketing?
Adefran – Na prática, faço uma orientação específica. As empresas costumam contratar uma empresa de marketing para gerenciar o tráfego pago e todo aquele marketing normal, só que essas agências geralmente não conhecem o nosso setor. Elas conseguem ter êxito em certos nichos. No áudio é totalmente diferente. Hoje em dia eu faço um complemento desse marketing(tradicional). Eu dou consultoria para muitas empresas e profissionais do áudio. Converso com as pessoas que são do marketing interno, com as empresas que tratam o marketing dessas empresas de áudio para que elas tenham o melhor desempenho possível. Também cuido da imagem digital de técnicos de som renomados de artistas em nível nacional. Cuido do marketing deles para que consigam estabelecer o que chamamos de "autoridade" no meio digital, mas, para isso, precisam exercitar umas aplicações para que as pessoas entendam essa autoridade. Hoje em dia, um técnico de som não pode mais ser visto como um cara marrento. Ele precisa ter inteligência emocional e traquejo, porque as relações pessoais é que fazem com que ele consiga tanto atender bem a um artista como ser bem recebido pela empresa locadora.
Backstage – Algo mais que gostaria de destacar?
Adefran – É fundamental ressaltar a importância de ferramentas como a Backstage. As novas gerações precisam entender o peso que a revista tem no setor e como ela confere autoridade às marcas e profissionais que aparecem nela. A Backstage tem um papel essencial na validação de credibilidade dentro do mercado de áudio. Sempre foi uma referência para mim. Eu sou colecionador da revista e sempre enxerguei nela uma autoridade no nosso meio. O Instagram e o YouTube são importantes, mas quando uma empresa ou profissional aparece na Backstage, ganha um selo de credibilidade. Eu acredito que a revista precisa ser resgatada para as novas gerações e voltar a ter edições físicas em feiras e eventos, nem que seja algumas vezes ao ano.